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Notícias e reflexões sobre planejamento e questões sociais nas cidades brasileiras

Archive for maio 2011

Reações sobre a não-estação Angélica

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foto: WikiCommons

Ontem pelo manhã, antes que o tema se tornasse o hit do dia, escrevi um texto sobre a decisão do Metrô em não construir a estação Angélica, depois da pressão da associação de moradores do local. Acho que vale a pena recuperar o assunto e pensar sobre as reações que o fato provocou.

O texto Droga de Elite, de Fernando Canzian, publicado no site da Folha, deu voz à indignação da maioria dos moradores de São Paulo que se sentiram ofendidos com o absurdo de recusar uma estação de Metrô perto de casa, algo que povoa a imaginação de muita gente que mora longe das linhas já existentes. Metrô perto de casa sempre foi meu sonho de consumo, e acredito que de 90% da periferia. Mas voltando ao texto, diz Canzian: “Reclama-se muito que São Paulo não consegue ser cosmopolita, democrática. Vamos a Nova York e à Europa e voltamos deslumbrados. Carentes da não dependência do carro e saudosos de ‘civilização'”. A coluna foi recomendada por mais de 6 mil pessoas no Facebook e por incontáveis usuários no Twitter.

E foi no Twitter que o processo de ridicularização da ‘elite de Higienópolis’ continuou. Pela manhã, o termo Higienópolis figurou por horas entre os mais comentados no Brasil. À tarde, a coletividade virtual aproveitou uma declaração infeliz de uma psicóloga, moradora do bairro, e criou a tag #gentediferenciada. Em entrevista à própria Folha no ano passado, essa moradora (não vou repetir aqui seu nome) rejeitou a ideia do Metrô no local porque a estação poderia atrair “uma gente diferenciada”.

Churrascão em Higienópolis a favor do Metrô

A piada rolou solta no Twitter até que o jornalista Danilo Saraiva a transpôs para o Facebook e criou o evento ‘Churrascão da Gente Diferenciada‘, a ser realizado em frente ao Shopping Higienópolis, um dos mais luxuosos da cidade. A descrição do evento diz: “Leve farofa, carne de gato, cachorro, papagaio, som portátil, carro tunado e tudo o que sua consciência social permitir. Afinal, a rua é pública e o Higienópolis não está separado por muros”. Até agora, a iniciativa tem a adesão mais de 41 mil pessoas. Resta saber se pelo menos algumas delas realmente comparecerão ao evento, marcado para este sábado (14), às 14h.

Enquanto a reação aos 3,5 mil poderosos de Higienópolis acontecia no mundo virtual, o Metrô entrou em cena para dizer que não era nada daquilo. Apesar de a reportagem inicial da Folha atestar que o Metrô concordou com a mudança depois da reclamação dos moradores, o presidente da Companhia, Sergio Avelleda, afirmou para a Veja SP que a mudança teve razões técnicas para acontecer e que a estação continuará em Higienópolis. Hoje pela manhã a rádio Estadão/ESPN conversou com Avelleda, que repetiu o mesmo argumento. Uma coluna de Paulo Moreira Leite na Época Online também aborda do assunto. Fora da imprensa, o professor do curso de Políticas Públicas da Each-USP José Carlos Vaz também se manifestou a respeito. (Mais uma reportagem a respeito pós-publicação do post: SPTV hoje à tarde. Fiquei surpresa com o tom agressivo das perguntas, por ser um telejornal da Globo)

Voz dissonante

No sentido contrário, Sérgio Malbergier publicou a coluna Ser rico não é pecado na Folha Online defendendo a elite de Higienópolis, e, até, a elite de uma forma geral. Seus argumentos, na minha opinião, são risíveis. Escreve Malbergier: “A pressão da comunidade, sim, “ricos” também formam comunidades com direitos iguais às outras comunidades segundo a Constituição brasileira, pode ter influído na decisão do Metrô de mudar a estação do bairro habitado por eles para perto do estádio do Pacaembu.”

Essa frase só faria sentido se as comunidades que não são ricas – incluo aqui até a classe média mais remediada – tivesse algum poder de influenciar as políticas públicas na cidade. Não têm. Não custa lembrar que a democracia em São Paulo é assimétrica. Uns poucos têm voz, a maioria aceita calada os desígnios de quem tem mais poder. Gostaria que alguém me contasse algum caso em que uma associação de moradores de favelas ou da periferia tenha sido ouvida a ponto de alterar profundamente uma decisão já tomada pelo poder público. Eu não conheço, mas gostaria de conhecer. Ricos têm sim que ter voz. Mas só se todos tiverem. Se não for assim, a cidade estará replicando suas antigas estruturas de poder**.

Política vs. Técnica

O plano de instalar a estação Angélica no local onde hoje funciona o Pão de Açúcar da Av. Angélica havia sido tomada baseada em estudos técnicos. Os moradores têm todo o direito de querer preservar seu mercado. Uma moradora declarou à Folha que preferia que o Mc Donald’s, que fica a alguns metros de distância,  fosse desapropriado. Acho que esse tipo de sugestão todos podemos entender. Mercado vale mais para a vizinhança que lanchonete. Se isso não afetar a viabilidade da obra, não vejo porque não acatar o desejo dos moradores.

Acontece que não foi essa a reclamação dos moradores. Eles não querem apenas preservar seu mercado, mas ficar longe de pessoas pobres. Para isso, a estação não pode ficar perto, de maneira alguma. Só que existe um estudo técnico do Metrô que diz que a demanda ali justifica uma estação. A única maneira de confrontar esse fato é com um novo estudo técnico. Não é a minha opinião, a dos moradores, a do presidente do Metrô, a dos colunistas da Folha que conta, mas sim uma avaliação pragmática de demanda e localização.

Me parece óbvio que não existe um novo estudo técnico, pelas palavras de Sergio Avelleda nas entrevistas citadas acima. A pressão dos moradores fez com que o Metrô tivesse que estudar mais uma vez uma região que já tinha avaliações prontas. O Metrô pode chegar à conclusão que uma estação mais próxima ao Pacaembu atenda à mesma demanda? Pode. Mas terá que mobilizar técnicos e gastar mais tempo e dinheiro para fazer isso. Quem mais na cidade tem um poder político tão grande sobre uma obra pública? De que maneira isso pode ser considerado justo?

** Para entender melhor as estruturas de poder de São Paulo no plano urbanístico recomendo o excelente livro A Cidade e a Lei, de Raquel Rolnik. Ao passear pela história das primeiras leis de regulação do espaço urbano em São Paulo, a autora explicita as relações de poder na cidade, em uma época em que tanto ex-escravos como imigrantes recém-chegados eram ignorados.

Written by thalitapires

12 de maio de 2011 at 13:49

Governo de SP se curva diante de argumentos preconceituosos

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Moradores de Higienópolis não querem o metrô @pixel - fotógrafo: U Explorer (2011)

Li na Folha (aqui, nota da Folha Online; o texto completo é só para assinantes) hoje: Governo de São Paulo desiste de construir a Estação Angélica do Metrô depois de protestos e abaixo-assinado de moradores de Higienópolis (bairro nobre de São Paulo próximo ao centro). A estação seria parte da futura Linha 6 – Laranja, que ligará a Brasilândia, na Zona Norte, ao centro. Com a desistência, o Metrô voltou a estudar a possibilidade de construir uma estação na Praça Charles Miller, em frente ao estádio do Pacaembu.

A estação Angélica foi planejada de acordo com estudos de demanda feitos pelo Metrô. A previsão era de que 25 mil pessoas usassem a estação diariamente. Mas os argumentos dos moradores de Higienópolis aparentemente tiveram mais peso que planejamento técnico. Eles reclamam, entre outras coisas, que já existem estações de Metrô no entorno, que o fluxo de pessoas no local seria aumentado, que haveria um aumento no número de ocorrências indesejáveis no bairro  e também da possibilidade de instalação de camelôs no local. Poucas vezes o nome do bairro e seu perfil estiveram mais consonantes: todos os argumentos são higienistas. Os moradores não querem contato com pobres, simplesmente. O fato de que existem 3 faculdades na região (Mackenzie, PUC e Faap) e de vários prédios de escritórios na Av. Angélica nãopareceu importante para os verdadeiros ‘donos’ do local. Aliás, nem a possibilidade de melhorar a mobilidade em benefício próprio contou. Afinal, quem assina abaixo-assinado contra o Metrô está bastante satisfeito com sua vida dentro de um carro.

Mais importante que criticar a postura dos moradores – por inaceitáveis que sejam os argumentos, eles têm o direito de tentar manter seu padrão de vida – é entender os motivos que levaram o Governo a aceitar a pressão dos moradores. Ou o estudo técnico era de má qualidade ou a pressão de moradores ditos influentes pesou. Como exemplo, a nata do tucanato paulista mora no bairro (não insinuo aqui que eles foram contra a obra, duvido que algum político faria isso; só quero mostrar o nível de ‘influência’ dos moradores do bairro). Ambos os casos são ruins.

Pior ainda é o plano de instalar uma estação na frente do Pacaembu. A prática recente em todo o mundo é construir estações de trens e metrô a pelo menos algumas centenas de metros dos estádios. Isso ajuda a encaminhar melhor o fluxo de pessoas. É assim em Wembley, em Londres, no Stade de France, em Paris e até no Morumbi, em São Paulo (a estação será a 1 quilômetro, só não se sabe quando será inaugurada). Em contrapartida, o Emirates Stadium, em Londres, tem uma estação praticamente na porta (que foi construída em 1906, antes que o Arsenal se instalasse no bairro). Tive a oportunidade de usar a estação depois de um jogo e a experiência não foi boa. A estação fica lotada ao ponto de ser insegura.

Espero que a reação contrária a essa decisão consiga fazer um contraponto aos desejos dos moradores locais. O bairro não é usado apenas por eles, mas pelos que lá trabalham, estudam ou simplesmente passam. O envolvimento dos moradores é importante sim e deve acontecer em todos os bairros. Quando só os cidadãos ricos e influentes são ouvidos, fica clara a assimetria da democracia na cidade.

Written by thalitapires

11 de maio de 2011 at 10:41

São Paulo lança programa de proteção ao pedestre

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Foto: Guarulhos Web

A Prefeitura de São Paulo lança hoje um plano de proteção aos pedestres. Serão criadas 11 Zonas Máximas de Proteção ao Pedestre, nos pontos da cidade em que mais acontecem atropelamentos, que terão sinalização específica e reforço de agentes de trânsito para garantir que motos e carros respeitem as faixas de pedestres. De acordo com as informações que já foram veiculadas pela imprensa, o objetivo é diminuir as mortes por atropelamento pela metade. Na primeira fase do programa, a prioridade é a educação dos motoristas. Depois, haverá a aplicação de multas aos motoristas que não respeitarem a faixa.

A iniciativa de proteger os pedestres é bem-vinda, mas só mostra o quão atrasada a cidade está no que diz respeito a esse assunto. Atenção aos pedestres não é apenas cuidar para que os carros não parem na faixa em 11 cruzamentos. Isso, na verdade, já deveria vir no pacote de uma cidade com 7 milhões de veículos. Tampouco é apenas uma questão de segurança. Pedestre não é um ente separado do trânsito, um problema a ser resolvido, mas sim uma parte da solução para os problema de mobilidade na cidade.

O que a cidade – qualquer cidade – precisa é de uma política que cuide das calçadas, aumente o espaço de circulação para pedestres, que promova comércios, escolas, postos de saúde locais em todos os bairros, entre outras medidas que podem ajudar a diminuir a necessidade por deslocamentos motorizados. De acordo com a Pesquisa de Origem e Destino realizada pelo Metrô em 2007, 36% dos deslocamentos em São Paulo já acontecem a pé. A análise da renda dos entrevistados mostram, no entanto, que andar a pé não é uma opção atualmente, mas a única maneira de locomoção para quem tem pouca renda. Conforme a renda sobe, o número de viagens a pé cai. Se nada for feito, conforme a renda média dos paulistanos subir, maior será o número de deslocamentos motorizados. Como a renda de 2007 para cá aumentou de fato, é provável que o número de viagens a pé já tenha diminuído.

Amanhã, vou escrever mais sobre iniciativas de outras cidades para estimular viagens a pé.

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11 de maio de 2011 at 00:18

Rock in Rio? Só de ônibus

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A organização do Rock in Rio 2011 divulgou nesta semana informações sobre o transporte para o evento, que acontece entre os dias 23 de setembro e 2 de outubro. Com agradável surpresa, descobri que não haverá lugar para o estacionamento de automóveis particulares. A Cidade do Rock, em Jacarepaguá, longe toda vida de quase qualquer lugar da cidade, será alcançada primordialmente por ônibus. Haverá a criação de duas linhas especiais para o evento.

A iniciativa já me parecia excelente só com essas informações. Mas as declarações de Roberta Medina, vice-presidente executiva do festival, publicadas nessa matéria do G1 me fizeram enxergar uma perspectiva nova. Disse ela: “Vamos facilitar muito esse acesso para que, mesmo aqueles que não têm o hábito de andar de ônibus, sintam-se tranquilos e confortáveis para utilizar este tipo de transporte coletivo”.

Isso significa que aquelas pessoas que foram praticamente criadas dentro de um carro e nunca pegaram um ônibus fatalmente terão que fazê-lo. Acho que é uma oportunidade única de mostrar a essas pessoas que ônibus pode ser bom, funciona, vai rápido. Claro que uma parcela daqueles que iriam de carro acabarão usando táxi para chegar, mas ainda assim é um avanço. Quanto mais iniciativas para restringir o uso de carro particular, melhor.

As justificativas oficiais para o uso do ônibus são relacionadas à sustentabilidade. O Rock in Rio quer cortar as emissões de carbono e uma das maneiras é impedir o uso de automóveis pelas 100 mil pessoas que deverão ir aos shows a cada dia.

Written by thalitapires

6 de maio de 2011 at 14:20

Publicado em mobilidade

Nova Luz e Parque Dom Pedro são exemplos de falta de participação

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Sesc e Senac se instalarão na área (foto: Prefeitura/SP)

Deu no Estadão de hoje: a Prefeitura de São Paulo lançou um projeto para a revitalização da região do Parque Dom Pedro II. O pacote inclui a demolição de três viadutos, o enterramento de um trecho da Avenida do Estado, criação de mais de 2 mil vagas de estacionamento, mudança na localização do terminal de ônibus (a mais importante conexão de ônibus do centro com a Zona Leste), construção de moradias populares, entre outras mudanças.

A Prefeitura tem o direito de sugerir o que quiser para a cidade. Algumas das mudanças parecem realmente benéficas. O problema é que a administração apresenta um pacote de medidas dessa magnitude em uma coletiva de imprensa e acha que é suficiente para informar a população. Quem mora e trabalha no local não tem ideia do que está acontecendo.

Isso já é verdade em relação à demolição do Edifício São Vito. A obra está acontecendo, mas o futuro da área é um mistério. Pelo que a mesma matéria deixa transparecer, era um mistério para a própria Prefeitura. Antes, o objetivo era construir um edifício estacionamento no local. Ontem, um protocolo de intenção foi assinado para que a área seja ocupada por uma unidade do Sesc e outra do Senac. Essa saída me parece muito melhor do que o edifício garagem, mas quem discutiu sobre isso?

A falta de participação da sociedade nas decisões da Prefeitura assusta. Parque Dom Pedro, Nova Luz, Operações Urbanas, tudo é decidido nos gabinetes e aplicado sem qualquer consulta. Assim, perpetua-se a noção de que democracia é só eleger alguém e esquecer o assunto por mais quatro anos. É uma ideia confortável, mas que precisa ser combatida.

Não acredito que esse movimento possa partir da própria administração pública, que provavelmente não apreciará ter mais trabalho para fazer reuniões com moradores, explicar o projeto em detalhes e, principalmente, ouvir e levar as críticas em consideração. De fato, participação dá trabalho. Mas é necessário. Experiências bem sucedidas existes em todo o mundo, inclusive no Brasil – o mundialmente famoso Orçamento Participativo de Porto Alegre. Se nenhuma experiêcia for aplicável a São Paulo, que se crie um maneira nova. O que não pode acontecer é o contínuo alijamento dos cidadãos em relação aos rumos de sua própria cidade.

ps: Nesse post, Raquel Rolnik faz outras críticas ao projeto do Parque Dom Pedro.

Written by thalitapires

5 de maio de 2011 at 17:00

Chuvas desalojam mais de 60 mil em Pernambuco

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Moradores de Barreiros improvisam embarcação (foto: AE)

As chuvas da última semana em Pernambuco já afetaram 49 municípios em Pernambuco. Deles, 22 já decretaram estado de emergência. De acordo com os últimos dados da Coordenadoria de Defesa Civil de Pernambuco (Codecipe), o número de famílias desabrigadas chega a 4.080 (cerca de 20.400 pessoas). Além disso, cerca de 8.500 famílias – 42.515 pessoas – estão desalojadas, morando em casa de amigos ou parentes. Duas pessoas morreram.

Recife, uma das cidade mais atingidas, sofre com alagamentos por várias regiões. Até a noite desta quarta-feira, cerca de 50 famílias das comunidades ribeirinhas de Lagoa Encantada, Costa Porto, Córrego da Bica e do Sargento, Tancredo Neves, Alto do Capitão e do Mandú, Águas Claras e Vasco da Gama foram encaminhadas para casa de parentes.

Já choveu, até hoje (5) 80% do previsto para todo o mês de maio na região. De acordo com a previsão do tempo, as chuvas devem continuar.

O Ministério da Integração Nacional liberou R$ 18,7 milhões para ações de socorro e assistência às vítimas do Estado de Pernambuco. A decisão foi publicada nesta quinta-feira, no Diário Oficial da União

Donativos estão sendo recebidos nos quartéis da Polícia Militar ou do Corpo de Bombeiros. Para ajudar na reconstrução das cidades destruídas, o Governo do Estado disponibiliza a seguinte conta bancária

Caixa Econômica Federal (banco 104)
Agência 1294
Operação 006
Conta 2010-0
CNPJ 11493327/0001-69

Written by thalitapires

5 de maio de 2011 at 14:54

Publicado em enchentes