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Estádios esquecem acessibilidade

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Sou são-paulina. Deixei essa informação de lado na minha apresentação pessoal por não achar relevante, mas agora ela faz sentido. Estou confortavelmente sentada no sofá de casa assistindo São Paulo x Santa Cruz pela Copa do Brasil e não pude deixar de sentir saudade da época em que ia ao Morumbi assistir aos jogos do meu time. Esse era o único momento em que me sentia afortunada pela localização da minha casa. O Campo Limpo fica grudado ao Morumbi, e na volta para casa, o bairro ficava sempre na contramão da galera que tentava voltar para casa em direção ao centro.

Isso tudo veio à minha cabeça quando pensei como faria para ir ao jogo caso morasse em São Paulo. A Arema Barueri fica, bom, em Barueri. Barueri é uma cidade da Grande São Paulo, na beira da Castelo Branco. Isso é longe. Não necessariamente longe em quilômetros, mas em acessibilidade. Estádio precisam ter transporte público perto. Ainda que o jogo tenha um público decepcionante, é sempre uma aglomeração para chegar e, principalmente, deixar o estádio. Fiz uma pesquisa breve na internet sobre o caminho do estádio para o centro de São Paulo. São cerca de 30 quilômetros. Para sair do estádio e chegar à Praça da Sé, são necessários pelo menos dois ônibus, um metrô e duas horas.

portalbarueri.com

Estádios devem ser locais de fácil acesso. Isso é verdade em relação aos estádios mais tradicionais, como Pacaembu (estações Barra Funda e Clínicas a cerca de 1 quilômetro), Palestra Itália (estação Barra Funda), Maracaná (estação Maracanã, São Cristóvão, trem e diversas linhas de ônibus) e, até, o Morumbi, que apesar de não ter transporte sobre trilhos por perto ainda, tem um corredor de ônibus com cerca de 20 linhas em direção ao centro da cidade (ou, no sentido contrário, ao Campo Limpo!).

Não é o caso de novos estádios como a Arena Barueri e o Engenhão, no Rio. O estádio de Barueri é totalmente fora de mão para quem mora na Capital. O fato de o estádio ter sido construído para abrigar o antigo time da cidade (o Grêmio Barueri, que virou Grêmio Prudente depois de um problema com a prefeitura) não é desculpa. Não é possível que uma prefeitura construa um estádio na Grande São Paulo apenas para os moradores locais. Barueri não tem tradição futebolística, o que significa que apenas jogos com times tradicionais da região recebem uma quantidade razoável de torcedores. Torcedores esses que, na sua maioria, vêm da Capital. Em um jogo à noite, no meio de semana, a situação é pior. Ainda que haja uma estação de trem nas proximidades, o resto da rede para de funcionar no final da noite. Mesmo que o torcedor consiga embarcar em um trem, o que é difícil, o que ele fará quando chegar à Barra Funda? Sem metrô ou trem, restam poucas opções de ônibus.

No Engenhão, a situação é parecida. O estádio fica ao lado da estação Engenho de Dentro do trem, mas é só. Os ônibus são limitados e não há ponto de táxi por perto. Estive num jogo no Engenhão e ir embora foi uma aventura. Além disso, tenho amigos que moram em Pilares, próximo ao estádio, que dizem que a promessa, na época da construção do estádio, era a melhoria da conexão do bairro com o resto da cidade. Para quem não conhece, o Engenhão fica no meio de um bairro completamente residencial. Essa melhoria nunca aconteceu. É sempre bom lembrar que o estádio foi construído para o Pan 2007. Lá se vão 4 anos, e nada na vizinhança mudou.

Google Maps

Em compensação, os dois estádio têm ótimo acesso para carro. A Arena Barueri fica perto da Castelo Branco e o Engenhão fica na beira da Linha Amarela. Se eu tivesse carro, não seria tão difícil chegar (sobre estacionamento, não sei dizer). Mas está errado. Estádios são espaços de aglomeração de pessoas, que vão embora todas ao mesmo tempo. Só um sistema de transporte coletivo de massa é capaz de atender esse público. Em Londres, todos os estádios que enchem ficam perto de uma estação do Metrô. Uma vez dentro de um trem, é possível chegar a qualquer canto da cidade.

Não sou utópica. Sei que o transporte coletivo sobre trilhos é falho no país e que nenhuma cidade tem a possibilidade de ter um metrô com tantas conexões. Mas o futebol só existe com gente no estádio. Se não há metrô que sirva para todos, é preciso, no mínimo, que haja ônibus que atendam aos torcedores. Ainda mais nos horários horrorosos em que os jogos acontecem no Brasil.

Written by thalitapires

6 de abril de 2011 at 23:32

Publicado em mobilidade, Trânsito

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Marginais continuarão a encher no próximo verão

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crédito: OAS

As Marginais Pinheiros e Tietê e os bairros que margeiam o rio Tietê continuarão a sofrer enchentes no próximo verão. Essa é a conclusão óbvia a ser tirada depois do cancelamento, pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE/SP), da licitação que iria contratar os responsáveis pelo desassoreamento do rio. A informação vem da matéria de Artur Guimarães, no UOL. O Tribunal decidiu, de forma definitiva, que um serviço de alta complexidade técnica como esse não pode ser contratado pelo sistema de pregão, que exige padrões de qualidade objetivamente definidos. A matéria elenca ainda outros problemas com a licitação.

As tempestades em São Paulo começam no mês de novembro. É improvável que até lá a licitação esteja terminada. Ainda que  isso seja possível, serão meses sem limpeza do fundo do rio, condição mais importante para a ocorrência de enchentes. Junte-se a isso o fato de que o Tietê ficou sem limpeza por quase 3 anos, entre 2006 e 2008 e as inundações tornam-se quase um imperativo lógico. Tragédias como a do Jardim Pantanal, no verão retrasado, podem se repetir.

A limpeza do fundo do rio virou bandeira eleitoral de todos os candidatos ao palácio dos Bandeirantes nas eleições de 2010. Mesmo Geraldo Alckmin, candidato do mesmo partido do então governador José Serra, foi obrigado a embutir na campanha críticas veladas ao gerenciamento das enchentes em São Paulo. Eleito, lançou junto com Gilberto Kassab um pacote de R$800 milhões para o combate às enchentes, do qual fazia parte o desassoreamento do Rio. Resta saber como o governo estadual justificará uma falha técnica dessa envergadura em um dos principais projetos da gestão.

Written by thalitapires

6 de abril de 2011 at 18:51

Cidade de São Paulo chega aos 7 milhões de veículos

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Clayton de Souza/AE

Vítima de ações públicas que, ao longo da história, privilegiaram o transporte individual em detrimento do coletivo, a cidade de São Paulo bateu em março uma marca histórica, no mau sentido. A capital chegou aos 7 milhões de veículos registrados no Detran. A maior parte deles – exatos 5.124.568 – são automóveis. O segundo maior grupo é o das motos, com 889.164 veículos. Há ainda 718.450 caminhonetes, micro-ônibus e outros utilitários e 42.367 ônibus.

Os números são assustadores por qualquer ângulo que se olhe. A cidade tem 10.659.386 habitantes, de acordo com o Censo de 2010. Se a pirâmide etária da cidade seguir o padrão nacional, cerca de 15% da população tem menos de 18 anos e não pode ter um carro. Sem contar os ônibus, a conta aproximada é a de 0,77 carro por pessoa. A ideia de muitas pessoas de que um dia o grande congestionamento virá e ninguém conseguirá sair de casa porque todas as ruas estarão tomadas pelos carros não parece longe.
Que a cidade está presa a esse modelo de mobilidade há décadas é impossível discordar. Mas usar o passado para justificar os erros do presente está ficando fora de moda. Nós somos vítimas de escolhas erradas de governantes desde Prestes Maia, nas décadas de 30 e 40, mas continuamos fazendo as escolhas erradas. A construção da terceira pista na Marginal Tietê é o exemplo mais bem-acabado de como a orientação continua sendo pró-veículo, e não pró-mobilidade.

 
É importante citar, no entanto, que não são apenas as escolhas urbanísticas que contam. A indústria mais forte do país é a automobilística. A forte produção do setor foi um dos fatores que impediu que o Brasil entrasse na crise de 2009. Não há, portanto, opções fáceis aqui. É provável que qualquer decisão da Prefeitura ou do Estado que possa prejudicar a circulação de automóveis sofra a pressão da indústria. Esse é o jogo.

 
Para mudar essa lógica, o esforço deve ser conjunto. Prefeituras devem ordenar o trânsito e dar espaço para mais transporte coletivo e não-motorizado. Estados precisam investir em mais transporte de massa. E a União precisa buscar um modelo de desenvolvimento no qual as montadoras percam importância relativa para o país. Do contrário, o Brasil estará caminhando para ter uma porção de ‘são paulos’.

Written by thalitapires

6 de abril de 2011 at 01:18